Quatro cumes no vovô dos parques nacionais


Pico das Agulhas Negras (ao fundo à esquerda) e o Maciço das Prateleiras (centro), cumes mais concorridos do parque

Eram quatro horas da manhã e 12 veículos já aguardavam em fila a abertura do Parque Nacional de Itatiaia (RJ). Sob uma neblina densa e os termômetros marcando 4°C, montanhistas e aventureiros tiravam um último cochilo dentro dos carros estacionados na estrada de terra de acesso ao parque. A entrada seria liberada dali a três horas, quando as concorridas senhas para a ascensão ao Pico das Agulhas Negras seriam distribuídas. No dia anterior daquele feriado de Corpus Christi (junho/2019) a chuva não havia dado trégua e a minha expedição de subida ao cume tinha sido cancelada por questões de segurança. Todos estavam ansiosos para vencer o gigante negro, uma jornada de quase nove horas de subida e descida. O Agulhas Negras é a quinta montanha mais alta do Brasil e a mais disputada do parque.

Itatiaia é o vovô dos parques nacionais. Completou 82 anos em 2019 e, podemos dizer que está em boa forma, embora sua infraestrutura para os visitantes poderia ser melhor. Como ocorre com tantos outros no país, a falta de manutenção acaba impedindo que santuários naturais sejam desfrutados em todo seu potencial.

Apesar das limitações de recursos, Itatiaia segue sendo considerado uma joia por aventureiros porque reúne em sua área nada menos que três das dez montanhas mais altas do país. A maior delas é o Pico das Agulhas Negras (2.791 metros de altitude), mas também estão lá o Morro do Couto (2.680 metros) e a Pedra do Sino (2.670 metros). Além deles, outros dois maciços fazem sucesso embora não estejam no ranking dos 10 + do Brasil - Pedra do Altar (2.665 m) e Prateleiras (2.551 m).

"Só o cume interessa" é um mantra na montanha. Pela efeito cacofônico da frase, também é brincadeira para aqueles mais maliciosos. Em Itatiaia, quando o clima permite, é possível atingir um cume por dia. Em alguns casos, como o Agulhas Negras, subir e descer significa uma jornada de um dia inteiro. Nossa expedição teve sorte e fizemos quatro cumes em quatro dias no parque.


Primeiro trecho da trilha para chegar à base do Agulhas Negras
Chegar ao ponto mais alto do gigante de Itatiaia exigiu cerca de quatro horas de subida, alternando caminhada, escalada e rapel. Foram nove horas ao todo para subir e descer. A atividade começa com uma caminhada tranquila até a base da montanha. É exigido o acompanhamento de guia.


Início da escalaminhada na subida da montanha

A partir daí a subida é por entre rochas e suas fendas numa legítima escalaminhada. Em dois trechos é preciso escalar com a ajuda de cordas e, na descida, tem que vencer os paredões com rapel.

Trecho da subida em que é preciso superar um paredão com a ajuda de uma corda 

Caminhada entre as fendas das rochas

Depois da chuva no dia anterior, ascensão ao cume do Agulhas  Negras foi com céu azul e friozinho

Apenas 80 pessoas são autorizadas a fazer a ascensão do Agulhas Negras por dia. Por isso, a fila ainda durante a madrugada na porta do parque. Até minha visita o parque não trabalhava com reservas online. Havia uma previsão de que elas seriam implantadas a partir das ferias de julho.

Boas condições climáticas são indispensáveis para uma ascensão segura. Isso porque as rochas ficam muito escorregadias com chuva. Cheguei ao topo do Agulhas num sábado de céu azul, pouco vento mas friozinho. De lá de cima se tem uma vista 360 graus do parque acima das nuvens.

Do alto do Agulhas Negras

O Parque Nacional de Itatiaia é mais do que um destino de turismo de aventura. Ele faz parte da história política do país. Era o refúgio favorito do então presidente Getúlio Vargas, que criou o parque. A casa em que o político se hospedava, toda construída em pedra, ainda está lá. Mas por falta de manutenção não está aberta para visitação. O Itatiaia entrou no pacote de desestatizações do governo federal e foi concedido à iniciativa privada por 25 anos em fevereiro deste ano.

Não precisa ser montanhista para aproveitar o parque. A primeira vez que visitei Itatiaia foi em 2009 e aproveitei apenas a parte baixa onde estão cachoeiras, um lago e trilhas fáceis. Também pode-se pedalar na rodovia federal mais alta do país. Ela atravessaria o parque nos planos de Getúlio mas nunca foi concluída. Não tem restaurante nem lanchonete lá dentro, mas há áreas para piquenique, camping e banheiros.


Rodovia federal mais alta do país atravessaria o parque mas nunca foi concluída

Embora não seja tão alto, o Maciço das Prateleiras é o segundo cume mais desafiador do parque por exigir técnica e boa preparação dos montanhistas. Para chegar até sua base, percorre-se a pé trecho da BR  mais alta do país. A estrada cruzaria o parque, mas nunca foi finalizada.

Maciço das Prateleiras

Cume das Prateleiras

O ingresso custa R$ 34 (junho/2019) para um dia de visita. Se for entrar no parque mais de um dia, há descontos nos demais ingressos. O parque também cobra taxa para acampar e disponibiliza um refúgio com quartos compartilhados mediante reserva. No entorno do parque há opções de hospedagem. Eu fiquei em uma pousada em Itamonte. Toda a assessoria e organização do roteiro foi da Aventurista. Deixo aqui meu agradecimento a todos que fizeram essa expedição possível: Bruno, Bárbara, Marina, Fabi, Ricardo, Ellen, Carneiro e Moa.


Enfrentando o frio e a chuva

Tráfego intenso na montanha

Pacto fechado: "Só o cume interessa"

Todo dia madrugando às 3h 
 Todos no cume do Agulhas Negras



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