Brutalidade pura no El Paso John Gardner - Parque Torres del Paine

El Paso John Gardner no Parque Torres del Paine (Chile)

Com a temporada de verão se encaminhando para o fim na Patagônia chilena, entrei na barraca e me enfiei no saco de dormir debaixo de uma chuva fina de neve. O colchonete inflável não conseguia bloquear o frio que vinha do chão e eu passei a noite tentando dormir.

Às 5h da manhã (março/2023) o despertador tocou. Era hora de levantar para a jornada mais desafiadora do Parque Torres del Paine: cruzar o El Paso John Gardner. Seriam cerca de 12 horas de trekking para superar os 15 quilômetros que separam os acampamentos Los Perros e o Refúgio Grey.
Foi uma travessia extenuante e sob condições climáticas bastante desfavoráveis. Em resumo, o caminho consiste em subir e descer um maciço montanhoso coberto de pedras, gelo e neve e cercado por dois glaciares, sendo um deles o maior do parque, o Glaciar Grey. Essa é a zona considerada mais inóspita e extrema do parque chileno.


Subida do El Paso John Gardner com neve caindo


A travessia é lenta. Un paso a la vez! O vento estava bastante forte. Toda a subida foi com neve caindo, e o frio dos dias anteriores havia formado sobre a montanha uma camada de gelo fina e escorregadia. Subimos seguindo a pegada deixada pela pessoa da frente para maior segurança. Mas por diversas vezes tivemos que abrir o próprio caminho, quebrando o gelo com o pé e garantindo apoio para o próximo passo.
Para ninguém ali a manhã foi trivial. Foram quase três horas de subida até ficar cara a cara com a segunda maior geleira do Chile com 19 quilômetros de extensão. Apesar do vento e da neve, fiz força para abrir um pouco mais os olhos. Quando percebi onde havia chegado, finquei mais fundo os bastões de caminhada na neve, ergui o peito sobrecarregado pela mochila e parei para registrar aquela cena na memória (meu celular havia descarregado totalmente).


Glaciar Grey visto do El Paso John Gardner


Era uma imensa massa compactada de gelo sem fim de cor azulada e cinzenta. Suas fissuras desenhavam fendas e formavam pequenos lagos. De onde eu estava, a textura daquela geleira me lembrou algodão doce. Uma combinação perturbadora de brutalidade e fragilidade.
 A caminhada até o Refúgio Grey ainda levaria mais umas 6 horas. Por cerca de uns 30 minutos seguimos lado a lado com o glaciar até que entramos numa região de bosque num lamaçal causado pela chuva. Era sinal de que o trecho mais desafiador de todo o circuito de sete dias no Torres del Paine acabava de virar história.


Mirador Glaciar Grey




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